Aeroporto teve capacidade reduzida nos últimos anos devido a acidentes; consultorias dizem que ampliação é possível, desde que segurança seja melhorada
As principais companhias aéreas do País defendem um aumento no número de voos do aeroporto de Congonhas, em São Paulo. O terminal opera atualmente com 34 movimentos (pousos ou decolagens) por hora, mas chegou a fazer 54 no final dos anos 1990. A ampliação do uso, proposta pela Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), seria uma forma de "crescer um bolo" agora cobiçado por empresas regionais, como Azul e Trip.
O setor trava um debate sobre o uso do aeroporto. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) divulgou que irá rever a norma que regulamenta o uso de aeroportos no País. A Secretaria de Aviação Civil (SAC), então, propôs um texto específico para mudanças em Congonhas. No projeto, as empresas que mais usam o aeroporto, TAM e Gol, perderiam espaço de operação para Azul e Trip.
"A Abear é favorável a essa revisão da norma. As quatro empresas (TAM, Gol, Avianca e Azul/Trip, que formam a entidade) são favoráveis. Mas defendemos uma revisão da capacidade do aeroporto", afirmou o presidente da associação, Eduardo Sanovicz, em coletiva de imprensa na terça-feira (19).
Congonhas sofreu duas reduções em sua utilização. Na primeira, em 2001, após acidente com um avião que transportava malotes bancários, a capacidade foi reduzida de 54 para 48 movimentos por hora. Na segunda, em 2007, após a tragédia com o voo da TAM, o índice caiu para 34.
Nesse período, o número de passageiros transportados no Brasil cresceu de forma significativa. Em 2002, primeiro ano da desregulamentação tarifária, houve 36 milhões de passagens vendidas, a um preço médio de R$ 500. Em 2012, foram 100 milhões de bilhetes, que custaram em média R$ 270.
O número de passageiros que passa por Congonhas, no entanto, acabou se mantendo estável – a até sofreu ligeira queda – em 17 milhões por ano. "O aeroporto serve de conexão para voos de todo o País, muitos dos quais só são viáveis porque passam por São Paulo. Por isso essa discussão é importante. Congonhas, atualmente, é um gargalo que dificulta o crescimento de toda a malha nacional", disse Sanovicz.
"Foram 15 anos de avanços técnicos, que permitem melhor uso dos aeroportos. Qualquer estudo, mantido o rigor técnico, vai apontar possibilidade de maior utilização de Congonhas", diz Sanovicz. A Abear não diz qual o número de voos que considera adequado ao aeroporto.
"A ideia de aumentar o número de voos em Congonhas é válida e possível de ser feita", diz Mário Luiz de Mello Santos, diretor-presidente da consultoria Aeroservice, que já apresentou propostas do tipo para a prefeitura da São Paulo. "Mas isso demandaria reformas para dar mais segurança nos pousos e decolagens, além de uma ampliação do pátio de aeronaves", afirma Mello Santos.
Para o especialista, a pista precisaria ser aumentada para que fosse colocado, nas extremidades, um tipo de concreto chamado EMAS (Emergency Material Arresting System), que serve para frear aviões em caso de acidente. A ideia também é defendida por Sanovicz, da Abear. Para a Aeroservice, o custo do projeto – incluindo a desapropriação de algumas casas na cabeceira da pista – ficaria acima de R$ 1,5 bilhão. A conta seria paga pela Infraero, que administra o aeroporto.
A Abear, ao defender mais voos, concorda que é necessário fazer reformas em Congonhas. "São quatro capacidades: pista, terminal, pátio e acessibilidade. O que dizemos é que a capacidade de pista poderia ser de 54 movimentos por hora. Mas se colocar hoje 54 movimentos por hora, com aviões de 180 passageiros (nos anos 1990, as aeronaves tinham em média 100 lugares), nao vai caber essas pessoas no terminal", diz Sanovicz.
Pressão das menores
Por trás dessa discussão, está o crescimento recente das empresas Azul e Trip, que se fundiram em maio do ano passado . Juntas, elas já detêm 16,45% do mercado de aviação civil brasileiro – a TAM é líder com 42,86%, seguida pela Gol, com 34,4% de participação.
De acordo com a revisão proposta pela Anac, as companhias regionais (Azul e Trip) terão maior acesso ao aeroporto de Congonhas (SP), atualmente concentrado nas grandes empresas, como TAM e Gol. A ideia é redistribuir os horários de pouso e decolagem (slots), levando em conta a pontualidade e a necessidade de abrir espaço para outras companhias.
"Isso vai aumentar a competitividade e melhorar a qualidade", afirmou o ministro-chefe da Secretaria de Aviação Civil (SAC), Wagner Bittencourt, quando anunciou a proposta de revisão.
A Abear afirma que é favorável a uma readequação. "As empresas menores cresceram e é natural que queiram mais espaço em Congonhas", afirma Sanovicz. O problema, segundo ele, é que a proposta prejudicaria as empresas que historicamente mais investiram no aeroporto. "Respeitar o ambiente (de negócios) regulado é fundamental na aviação, porque os investimentos são feitos em longo prazo. Se uma empresa pedir aviões agora, eles serão entregues em quatro ou cinco anos", diz.
Para ele, é uma questão de "crescer o bolo" que é Congonhas, em vez de dividi-lo em partes menores. "Tem um pedaço do bolo pronto pra ser comido, que colocaram no congelador e ninguém deixa usar", afirma Sanovicz.
"Esse é o debate para garantir novos entrantes em Congonhas sem criar uma crise na malha nacional. É um debate que afeta toda a malha aérea, podendo afetar seriamente a grande conquista da década, que é a inclusão do consumidor", diz.